BALANÇO AFRICANO
Existem duas formas de analisar em forma de balanço os resultados da Seleção Brasileira de Futebol ‒ e de seu treinador ‒ em sua passagem pela Copa do Mundo 2010: créditos e débitos nas colunas graças a e apesar de. Quem gosta do Dunga, respeita seu trabalho, valores e ideias, tende a repousar as múltiplas conquistas na coluna graças a, enquanto a coluna apesar de guardará as derrotas, problemas e decepções. Quem desgosta do Dunga, não concorda com seus pensamentos, ações e métodos ‒ odeia-o até ‒, fará o movimento contrário.
Os fãs do ex-capitão serão rápidos em contabilizar as 42 vitórias nos 60 últimos jogos na coluna do graças a. Lá estarão, também, os títulos da Copa América com uma das melhores campanhas de todos os tempos. A Copa das Confederações, as goleadas inesquecíveis, como aquela sobre Portugal, uma boa Olimpíada e o espírito de equipe também estarão na coluna graças a, bem como o resgate do necessário apego à camisa amarela de nosso selecionado ‒ ou alguém esqueceu o enfado que dominava nosso último time, enjoado de tanto dinheiro, fama e badalação? Para a coluna do apesar de, restarão algumas derrotas (6), a desclassificação perante a Holanda e o evidente medo de ousar.
Quem considerou a nova Era Dunga ‒ agora como técnico ‒ um fracasso, sob pena de ser desonesto, jamais esquecerá os números positivos. Porém, creditará tudo na coluna do apesar de. Afinal, quem mais além do Brasil seria capaz de abastecer a sua e tantas outras seleções com atletas de alto nível? Quantos craques e bons jogadores ficaram de fora dos 23 escolhidos, todos capazes de mudar os resultados? Assim sendo, ganhar certames menores seria mera obrigação. Algo que um poste faria também, se fosse escalado como técnico. Mas as derrotas, essas não: elas estariam na coluna do graças a, com todo (de)mérito. Principalmente a última, nas quartas de final da Copa do Mundo. Graças a Dunga, contra aquilo que parecia ser um consenso nacional, os meninos do Santos ficaram assistindo a Copa no Brasil. E morremos por falta de talento.
O temperamento de Dunga, sua eterna postura defensiva e firme, também é algo que cabe em uma coluna ou outra. Quem aprecia tal retidão, considera que perdemos em 1990 apesar dela e, graças a ela, vencemos em 1994. Estranhamente, os mesmos acontecimentos estarão creditados em colunas opostas por aqueles que não gostam da maneira dunguiana de encarar o esporte e a vida. Uns e outros, porém, concordam em um ponto: precisa ser muito Dunga para batizar uma geração fracassada e, logo depois, tornar-se o capitão do time que erguerá a taça. Na sequência, haja coragem para aceitar o desafio de treinar um novo grupo, abandonando o conforto de estar ‒ em parte ‒ redimido, sabendo que um só entre os 32 selecionados será campeão.
Dunga realmente não é alguém que habita os meio-termos. Com ele, tudo parece ser oito ou oitenta. Por isso, entre os méritos e as culpas, poucos comentaristas esportivos escaparão da armadilha de personalizar o debate, dividindo-se ‒ dividindo-nos ‒ entre os que gostam e os que desgostam do técnico. E engordarão e emagrecerão as colunas do graças a e do apesar de conforme a simpatia. De forma indelével, esse rapaz escreve com letras maiúsculas seu nome na história do futebol brasileiro. Passarão muitas décadas e, ainda assim, o debate sobre a personalidade de Dunga e sua trajetória será quente. Ainda mais que novos capítulos ainda estão por vir, já que o protagonista nem chegou aos cinquenta anos de idade.
Antes de concluir, é preciso definir meu ponto de vista nesse balanço de Copa. Julgo que tudo, entre vitórias e derrotas, aconteceu graças ao Dunga, sua comissão técnica, seu grupo de jogadores; em pleno acordo com as deliberações de vestiário e coerente com as atitudes em campo. E tudo também se deu apesar deles. Afinal, cantando outro hino, estavam adversários imbuídos do mesmíssimo desejo de vencer, beneficiados/prejudicados/regidos pela absoluta falta de lógica do futebol. Escalando Fernando Pessoa improvisado em raciocínio lateral, analisar o futebol é preciso, jogar bola não é preciso.
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