26.7.07

Número 225

DOIS PEITOS, DUAS MEDIDAS

 

Sou igual a muitos: Adoro o esporte e tudo o que ele traz de positivo para a sociedade. Por isso, acompanho com atenção Copas do Mundo, Olimpíadas, Fórmula 1, Campeonatos Nacionais de Futebol e, claro, Jogos Pan Americanos. Quando este interesse natural é somado a uma cobertura massiva da imprensa, como é o caso do Pan do Rio, aí mesmo que a tentação de ficar ligado no rádio e na TV cresce.

 

Os anunciantes sabem disso e compram, a peso de ouro, os patrocínios da programação. Também capricham nas campanhas, buscando, para si, inéditos louros comerciais. Comparando os jogos e as propagandas, vejo a existência de peitos muito diferentes. Sim, confesso: Termino por olhar tanto o quadro geral de medalhas quanto o quadro específico que compõe as atletas vencedoras. E, neste último, o volume dos seios.

 

Nas piscinas, nas quadras e nas pistas, percebo mulheres com corpos muito diferentes: Umas bem altas e esguias, outras extremamente fortes e um grupo de atletas no estilo mignon. Todas elas com belezas particulares, nem sempre tidas como padrão, mas com a inegável aparência de saúde. Em meio a tanta disparidade, uma constante chama a atenção: Quem emoldura as medalhas são os seios de porte médio para pequeno.

 

Como ensinou Darwin, o esporte não diminui os seios – são as atletas com glândulas mamárias menores que sobrevivem vencedoras. Desconsiderando as conseqüências de uma dieta controlada e de uma rotina de exercícios extrema, algo que reforça a existência de músculos em detrimento de outros tecidos, a verdade é que peitões, no esporte, só atrapalham.

 

Quando as atletas descem do pódio, entram os patrocinadores. E, durante os comerciais, mais especificamente nas peças publicitárias de cerveja, vejo mulheres em outra modalidade de competição. Neste certame, as fêmeas são todas exuberantes, sorridentes, magérrimas e... peitudas. Elas atiram-se para as câmeras mirando na mosca o imaginário masculino. Com isso (ou melhor, com tudo aquilo), ajudam a vender outro ouro: O dos copos.

 

Decotes mais do que generosos vencem até o mais desatento dos olhares. A cada cena, um ponto, um recorde, um ippon. Em ralos trinta segundos, e sem a chance de se fazer um exame mais detalhado – principalmente tátil –, ficamos com a impressão de que muitas das musas do lúpulo e da cevada não passariam em um antidoping. Mesmo assim, ninguém parece sonhar em desclassificá-las, legitimando o uso indiscriminado de silicone.

 

Não sei até que ponto a turma do marketing mediu o tamanho da preferência masculina em matéria de seios no momento de escolher as meninas das companhias de cerveja. Fico com a impressão de que tentam impor um modelo estrangeiro de beleza que, apesar de chamar a atenção, passaria longe do pódio brasileiro. Eu, pessoalmente, não sou muito fã de air-bag. Minha mulher ideal estaria apta a bater um bolão tanto na quadra esportiva quanto em outros campos. Quer dizer, para o meu gosto, o belo nasce da proporção. Sem essa de dois pesos (peitos!) e duas medidas.

19.7.07

Número 224


A ERA DE AQUÁRIO

 

Faz muitos anos, se não me engano em 1979, o mundo inteiro aplaudiu um musical cinematográfico adaptado do teatro chamado Hair Musical. Na peça, quarentona em outubro, uma música se destacava. Ela cantava a transformação que estava por vir no momento em que o mundo entrasse na Era de Aquário. Todos sabemos assobiar este tema. E, tanto quanto a dança na chuva de Gene Kelly, está firme na memória o ambiente de louvação presente na coreografia executadas pelos hippies.

 

Procurei informações sobre a tal Era e encontrei uma certa controvérsia. Para alguns estudiosos, Aquário regerá o mundo daqui mais de cem anos. Para outros, já está no comando. E, para um terceiro grupo, estamos vivendo um momento de transição entre a Era de Peixes e a de Aquário. Tenho a tendência de acreditar mais na posição moderada dos que defendem a transição por dois motivos: a paz e o amor prometidos estão longe de serem realidade. Mas a revolução tecnológica, típica do predomínio da razão, está em pleno curso.

 

Independentemente dos desígnios do céu, creio que o Brasil já está em sua Era de Aquário particular. Não bem aquela cantada pelos cabeludos dos anos sessenta. Explico: Nossas crianças brincam confiantes em locais desenvolvidos para propiciar segurança, aprimoramento físico e social, muitas vezes assistidas por profissionais de formação elevada e cercadas de cuidados por todos os lados. Bom, isso nos condomínios da classe média para cima, nos clubes e nas escolas particulares. Em outras palavras, os filhos daqueles que nasceram lá nos anos do Hair, e que lutam para garantir uma vida digna para a família, são criados em verdadeiros aquários.

 

Adiante, digo como acontecia a vida infanto-juvenil em Peixes: para comprar um disco, um livro ou uma calça jeans, eu, lambari, pegava um ônibus e rumava ao centro da cidade. Lá chegando, era como estar em mar aberto. Ao meu redor, cardumes de ambulantes vendiam desde agulhas até desentupidores de bicos de fogão; tinha a turma das roupas industrializadas e os hippies a ofertarem seus artesanatos; os vendedores de fitas K7 e aqueles que derrubavam bilhetes premiados nos pés de quem passava. Ciganos, prostitutas, aposentados, malandros, advogados, comerciantes, intelectuais, traficantes, um ecossistema riquíssimo estava na Rua da Praia (cresci em Porto Alegre). Naquele tempo, era preciso estar esperto. Mas, em Peixes, em regra, acontecia nada.

 

Hoje em dia, o mar aberto das avenidas ficou muito perigoso, com assaltos, seqüestros e assassinatos em grande número. A alternativa é circular em um ambiente climatizado, limpo, organizado, selecionado, bem iluminado, repleto de opções de entretenimento, planejado para o bem-estar e, o principal: seguro. Um lugar onde não é possível saber se chove ou faz calor, se já escureceu ou se o sol ainda brilha. Nas cidades grandes e médias, todos os que podem, optam por fazer os programas sociais e de compras no shopping center – uma metáfora perfeita para o aquário.

 

Paz, amor, liberdade, razão. Essas lindas promessas da ordem celeste pouco ou nada influenciam a Era de Aquário brasileira. Aqui, a guerra urbana, o desamor e a irracionalidade enclausuram as pessoas em ambientes preservados artificialmente. São prédios, muros, cercas, cancelas, portas giratórias e ar condicionado – uma vida em aquário. Um bem-estar comprado por poucos e à custa de muito investimento. Na contramão da ordem celeste, a desordem terrena atira os brasileiros no Aquário errado.

12.7.07

Número 223

A MARAVILHA ERRADA

 

Até poucos dias atrás, quando alguém creditava a si um valor imenso, desproporcional, argentino, dizia-se: O cara – ou a menina – se acha a oitava maravilha do mundo! A má notícia é o rebaixamento dos megalomaníacos ao pouco honroso décimo quinto lugar, pois foram eleitas mais Sete Maravilhas.

 

As primeiras Sete, as Maravilhas do Mundo Antigo, não foram propriamente eleitas, e sim listadas. Bom, isso até onde se saiba. Ao menos jamais foram encontrados, em algum sítio arqueológico, panfletos com as inscrições "Vote Rodes". A intenção, à época, foi indicar obras magníficas, erguidas pela engenharia humana, todas fundamentais para serem conhecidas e reverenciadas. O turismo, já na Antiguidade, era uma fonte de riqueza.

 

Hoje, no Mundo Moderno e democrático, a fundação New Seven Wonders organizou um concurso para listar as novas Maravilhas. Tal qual uma planetária votação de Miss Escolar, cada família se mobilizou para angariar votos para a sua maravilhazinha querida, considerando-na mais maravilhosa do que a do outro país. O prêmio desta gigantesca quermesse é a esperança de eternizar a sua obra e faturar com os turistas. Muito nobre!

 

Terminada a votação, nenhuma surpresa: O Brasil colocou o Cristo Redentor entre as Sete. Somos bons nisso de eliminar e escolher. Treinamos bastante com o Você Decide, o Big Brother Brasil, o Ídolos, a Dança dos Famosos etc. Pediu para ligar, mandar torpedo ou entrar na Internet, o brasileiro – aquele que é o melhor do Brasil – atende. Justo agora, no momento em que nunca na história deste país aconteceram tantas coisas, o monumento do Corcovado ficar de fora seria um golpe fatídico em nossa auto-estima. Aleluia! Cristo Redentor é cada vez mais imortal! Quase um Grêmio.

 

Na minha particular opinião – e correndo o risco de parecer antipático –, ao compararmos com outros concorrentes, o querido Redentor de braços abertos para a Guanabara é como a Miss Japão: Vence sem convencer. Porém, como se diz no futebol, o que vale é taça no armário e faixa no peito! Os franceses e sua Torre Eiffel tratem de se conformar. A Liberdade dos americanos do norte e a Acrópole grega que se mordam. Que todos os castelos e catedrais da Europa lambam suas feridas. Turistas dispostos a relaxar e gozar, venham a nós! E Cristo ilumine os controladores de vôo.

 

Mas, quem tem todos os motivos do mundo para estar com dor de cotovelo é a cidade de Brasília. Não entendo como a Capital Federal pode ter perdido para o lobby carioca a indicação brasileira no tal concurso. Afinal, desde os Jardins Suspensos da Babilônia, nenhum outro conjunto arquitetônico conseguiu pairar lindo e incólume (impune?) sobre a realidade cruel. Brasília, ela sim, é uma verdadeira Maravilha: Prédios suntuosos nos quais o concreto flutua e o dinheiro evapora. Quanta injustiça...

 

5.7.07

Número 222

 

O TAL COELHO

 

Magia pura: diante de uma platéia agitada, o homem entra no palco de fraque, capa e cartola. Despe-se da capa em uma coreografia grandiloqüente. Avança. Faz uma reverência ampla e, ainda dançarino, apanha com as mãos a cartola que tomba, ensaiada, de sua cabeça. Retorna ao centro do palco para depositá-la em uma mesa. Apanha sua varinha mágica e, três toques depois, retira da cartola um lindo e alvíssimo coelho. Palmas entusiasmadas!

 

Todos os que se propõem a escrever crônicas, contos ou poesias, como eu, também agem como o mágico acima descrito. Isto é, topam subir ao palco metafórico, criar os próprios salamaleques e, para o encantamento do respeitável leitor, tirar muitos coelhos da cachola. Tanto quanto formos competentes, maior será o brilho no olhar do público.

 

O livro é o ápice desta magia. Com ele, nossos truques ganham cenário de luxo – capa sedutora, diagramação caprichada, apresentação, orelha e sumário. Além do mais, galgam uma espécie de vida própria, como se rompessem com o autor para sair encantando sozinhos. É quando nós mesmos nos maravilhamos com a ilusão um dia criada, e que se torna real na mente do leitor.

 

Vivi, ainda agora, a minha primeira noite de autógrafos. Ok: já havia lançado um CD, com show e tudo. E, na época, distribuí autógrafos na qualidade de baterista. Mas, assinar sobre o primeiro livro foi algo de uma força incomum. Custo a crer que foram momentos de verdade, pois nem em minha mais otimista ficção pensaria em passagens tão felizes.

 

Quero agradecer, de coração, a todos os que fizeram parte do espetáculo em que se transformou o lançamento de O Y da questão. Nomeando alguns, por justiça plena: Lóris Brissac – editora; Alex Medeiros – design gráfico; Annete Baldi e Márcia Ivana – seleção das crônicas; Valesca de Assis – orelha; Luís Augusto Fischer – apresentação. Além dos queridos anfitriões Carlo & Sandro Zanetti – proprietários do Z Café. Por detrás de determinados nomes, suas competentes equipes.

 

Por fim, gostaria de demonstrar toda a gratidão aos queridos amigos que no Z compareceram. Afinal, foram os protagonistas de uma mágica que eu jamais imaginei possível. Chegaram de todos os lados para tirarem de uma carinhosa cartola o súbito coelho: era tanta gente que, para os passantes, eu virei um Paulo Coelho!