25.5.12

Calando por si

Número 474
Rubem Penz
– Arlete, promete ser fiel ao Pedro Geraldo na riqueza e na pobreza, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, amando-o e respeitando-o, agora e para sempre, de manhã, de tarde e de noite, domingos e feriados, por todos os dias da sua vida? (...) Perdão, não ouvi? (...) Como assim, "todos têm o direito constitucional de jamais produzir provas contra si"?
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Você está na cadeira do dentista. Há três algodões entre a bochecha e a gengiva (pensei que jamais escreveria uma crônica com essa palavra), um o sugador dependurado e uma broca cujo sonho secreto é beliscar sua língua. Então, o dentista faz uma pergunta atrás da outra. Saiba que, constitucionalmente, você tem o direito de ficar calado. Mas, dá muita vontade de mandá-lo para aquele lugar!
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Juquinha prestara muita atenção ao jornal da TV que coincide com o horário do jantar. No dia seguinte, durante a prova oral em que o professor cobrava o conteúdo, sustentou que poderia ficar calado sem que o professor pudesse fazer nada. Estava na constituição, segundo escutou o comentarista político: "Ninguém pode ser obrigado a produzir  (sic) prova contra si...". Vai precisar mais do que um advogado. Quem sabe um professor particular. Ou, no mínimo, deve limpar os ouvidos.
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– Querida, você esteve estranhamente calada essa noite, onde foram parar os gemidos sensuais?
– Sabe o que é, meu bem, aderi à sacanagem do momento.
– Como assim?
– Ficar calada e não produzir nenhuma prova de afeto.
– Nossa, é muita sacanagem...
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– Décio, estava aonde? E com quem você estava? Lá isso são horas de chegar? Custava deixar o celular ligado? Por que sua camisa está para fora das calças? Pensou que eu estaria dormindo? Pensou que 'alguma vez' eu estive realmente dormindo? Passou pela sua cabeça que isso aqui é uma família? Sabe que horas eu vou levantar amanhã, ou melhor, hoje? Acha que dormirá na nossa cama? Quer um travesseiro para dormir no sofá? Tenho um bom aqui, ó: tua amada Constituição!
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Alguém pensou na possibilidade de os depoimentos em tribunais ou CPIs produzirem provas a favor de si? Ou quem pensa assim é muito inocente?


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2 comentários:

Marcelo Rosa Gomes disse...

E se aplicassem neles a velha regra do "quem cala, consente"?

Rubem Penz disse...

Marcelo, parece que isso não dá...

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