13.5.10

Número 369

BULLYING E OMISSÃO

Quando pensamos em bullying no ambiente escolar, lembramos daquele valentão, quase sempre traiçoeiro, que oprime seus pares na base da humilhação e do terror. Também surge na memória a figura do jovem diferente, seja ele meio esquisito ou fora de medida, vítima primordial das chamadas brincadeiras de mau gosto. Porém, para que exista e viceje essa prática sociopática, um terceiro personagem estará necessariamente implicado: o grupo. Afinal, desde a primeira piada até a metódica perseguição, a turma estará diante de uma escolha, ou seja, qual partido tomará.

A grande covardia do praticante de bullying é resultado de uma inteligência estratégica: atormentar aquele que menos se parece com a média para, com isso, auferir prestígio. Ou, como segunda opção, afligir quem se apresenta naturalmente retraído. Tímidos e exóticos tendem à baixa capacidade de articulação e, desta forma, podem permanecer isolados e frágeis diante das agressões recebidas. São losers, na acepção norte-americana do caso. A aposta do cruel, quase sempre de sucesso, é de que ninguém tomará o partido do perdedor, sob o risco de fazer parte da turma “errada”.

Basta entrar em uma sala de aula ‒ de qualquer faixa etária ou social ‒ para identificar a presença de liderança, positiva e negativa, entre os colegas. Via de duas mãos, ela nasce na postura de quem a exerce e, simultaneamente, na dos que a reconhecem (aceitam). Por isso, a imposição física e psicológica de um líder negativo jamais deve ser desprezada: ela existe e é resultado de uma eleição silenciosa. O quadro obedece à perversa lógica do favorecimento, na qual alguém se alia ao opressor para, em um primeiro momento, escapar incólume de sua ação predatória. Depois, parecer igualmente forte.

No momento em que há um líder positivo no grupo, tendo ele capacidade de competir em igualdade de condições com o valentão, a chance de bullying diminui, mas não some. O apelo da transgressão ao redor do período da adolescência, seu charme e culto, é muito poderoso. Quando somado à garantia de impunidade que predomina em nosso tempo, torna-se ainda maior. Então, os virtuosos assumem a postura de autopreservação, fazendo surgir o individualismo ‒ outra marca da atualidade. Sob o manto do resultado pessoal em primeiro lugar, do cada um por si e Deus por todos, o azar será de quem ficou para trás.

Tal quadro pessimista com relação ao bullying na escola tem uma única chance de ser superado, e ela repousa justamente nos ombros do invisível e disforme grupo. Se existir um conjunto de valores elevados na maior parte da turma, tais como solidariedade, respeito, amizade, bom caráter ‒ aquilo que trazemos de casa ‒, bastará a primeira voz insurgente para neutralizar os maus tratos, antes de eles se tornarem sistemáticos. Assim, até mesmo o bullying ao contrário (segregação do agressor contumaz) será prevenido. Para tanto, pais e professores devem passar às crianças e aos jovens uma lição fundamental: quem não deseja ser vítima, jamais se omita. Neste e em todos os casos, a omissão dos justos é a vitória do crime.

5 comentários:

Paulo Seth disse...

Gostei muito do artigo. Eh de certa forma surpreendente o quanto dos problemas que temos, apesar das diferencas culturais e nacionais, sao globais. Na Inglaterra o governo atraves de suas escolas publicas (a maioria das escolas no Pais sao publicas, gracas a Deus) foi forcado a adotar uma postura muito mais rigida e agressiva com relacao e este problema. Claro que ocorrem ainda ocasionais eventos extremamente serios, como o que deixou 1 crianca de 11 anos a beira da morte pelo espancamento que foi vitima por outras 2 criancas de 11 e 12 anos.
Concordo 100% que a solucao esta nas maos vigilantes (e punitivas quando necessario) dos pais (em 1a. instancia) e dos professores. O que se ve com frequencia entretanto sao Pais que nao educam por exemplo tentando ensinar valores que eles proprios nao tem e nao demonstram, ou que se consideram muito ocupados para estabelecer uma relacao de confianca com os filhos (confianca requer muita atencao). Tambem de professores desmoralizados pela situacao precaria que em geral o ensino no Brasil se encontra (ou se encontrava ateh 3 anos atras quando ainda moravamos ai). Tambem por vezes os proprios Pais, apesar de muitas vezes se demonstrarem incompetentes ou incapazes de disciplinar seus filhos, mas capazes para defender as atitudes intoleraveis de suas crias em frente a um diretor ou a sociedade contra o professor. Eh um perigoso amor aquele que cega nossos olhos, mesmo sendo ele o amor incondicional que Pais tem para com seus filhos (a maioria quero crer).
O resultado eh que os Bullys podem eventualmente se tornar nos politicos do futuro, seres com duas caras que nao tem nenhum respeito pelo proximo e que vao pagar a falta de atencao e correta disciplina dos pais e da sociedade com a mesmo moeda quando este estiverem mais velhos.
Aqui se faz, aqui se paga.

Rubem Penz disse...

Paulo,
100% dos problemas nas escolas migram para a sociedade nos anos seguintes. Todas as atitudes positivas devem ser treinadas (aprendidas, praticadas) na idade escolar, sob risco de não formar bons cidadãos. E a família está implicada nisso até o pescoço!
Muito grato, abração, Mano

Paulo Pedott disse...

Obrigado por me incluir na lista de distribuição e parabéns pelo texto!
Mas me chama a atenção a aparente omissão dos administradores das escolas (professores, diretores, funcionários) que são as pessoas que podem se antepor ao problema em sua raiz, em sua gênese, muito antes de gerar as consequencias que vemos estampadas nos jornais e apresentadas em telejornais.
:-)
[[[ ]]]´s
paulo pedott

Rubem Penz disse...

Paulinho,
Há muita cegueira conveniente nos dias de hoje... E dá-le Inter!
Abraços, gratidão,
Rubem

Juno disse...

O bullying sempre existiu, embora não conhecido por este nome. As crianças e adolescentes podem ser muito cruéis. Atualmente está exacerbado. É inadmissível que não seja refreado pela escola, como é inadmissível o que está ocorrendo reltivamente à agressão a professores (esta sim, a meu ver é mais moderna. Ainda que, muitas vezes, o jovem faça parte do grupo apenas para ser aceito por ele, para não ser tido como careta, é da responsabilidade dos pais, em primeiro lugar, inculcar os valores positivos, entre eles a coragem de maniferstar opiniões. E, claro, sempre, à escola reprimir esse condenável comportamento.
E, Rubem, a última frase está genial: A omissão dos justos é a vitória do crime. Merece figurar- aqui não vai ironia nenhuma, amigão - em um algum das melhores citações da história!
Jussara

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