3.12.10

Número 398

SIM, NÃO, TALVEZ

Rubem Penz

Apesar de sermos todos iguais perante a lei, as diferenças entre homens e mulheres vão muito além da fitinha azul ou cor de rosa grudadas em nossas cabeças de recém nascidos. Isto é fato notório e explorado com razoável frequência. Mesmo assim, nos divertimos muito cada vez que constatamos o abismo que nos une. E foi mirando o penhasco que reparei como é diverso o modo de julgar o sexo oposto. As mulheres são, essencialmente, analíticas. Os homens, simplesmente holísticos.

Por exemplo, imediatamente depois de passado o scanner visual sobre um candidato a candidato afetivo, a fêmea da espécie humana está apta a gerar um relatório contendo de duas a três páginas de extensão. Basta que a amiga puxe conversa:

– Que tal aquele, hein?

– Olha, eu vi só de relance... O cabelo está meio desalinhado, o que traz um ar selvagem, ainda mais com a barba daquele jeito, por fazer. Gamei nas sobrancelhas. Os cílios, então: parecem até postiços. Olhos escuros, pele morena. O nariz poderia ser um pouco mais delicado, mas no conjunto não chega a comprometer. A orelha esquerda tem um furinho: ou ele já usou brinco, ou está sem ele hoje. A boca promete ser o ponto alto. Aliás, os dentes são bem claros e alinhados. Não duvido que tenha usado aparelho ortodôntico na adolescência. Queixo quadrado, forte, com uma leve covinha...

O espaço da crônica não permite que eu avance do queixo até os pés. Aliás, colocar-me no lugar da personagem mulher e, com ela, avançar ao limite da cabeça, já deu uma enorme canseira... Mas foi necessário para o leitor dar-se conta de que tudo o que foi visto pela moça foi registrado. Mais: está pronto para ser interpretado, desdobrado, analisado. Logo, de nada adianta o homem alugar um automóvel importado para impressionar a mulher desejada, se o restante dos sinais aponta para uma condição financeira instável e sujeita a chuvas e trovoadas. Além disso, para conseguir algo, o rapaz precisará dar seu recado com um bom xálalá. E nem assim estará no papo.

No caso de dois homens, uma cena semelhante e com idêntico objetivo teria o desenrolar muito diverso:

– Que tal aquela, hein?

– Eu teria a iniciativa imediata de acasalamento.*

Bom, isso na hipótese de ter simpatizado. Caso contrário, seria:

– Eu não teria a iniciativa imediata de acasalamento.**

Aí está a diferença de ser analítico e holístico: salvo algum pormenor que salte aos olhos – neste caso um "pormaior" –, o homem foca no todo. E com ele é pá, pum. Sim ou não. A mulher percebe detalhes um a um, do estado das unhas à idade do sapato. Além de, para ela, sempre ser talvez.

Melhor? Pior? Apenas diferente. E os estudiosos podem encontrar explicações que remontam o tempo das cavernas. Claro que isto dá pistas da facilidade de atender um e da dificuldade de agradar outra. Nada que seja impossível de contornar, sob pena de extinção da espécie.

*Sendo fiel à oralidade, a resposta tem uma só palavra e é sinônimo de alimentar-se.

**Idem, mais a negação

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