21.1.11

Número 405

A primeira crise              

Rubem Penz

Mal o presidente Lula deixou o comando da Nação, antes mesmo de notarmos sua ausência de fato (para muitos, inclusive para o próprio, a ficha demorará a cair), a atividade que mais movimentou mão de obra em seus oito anos de mandato já promete afundar em uma grave onda de desemprego. E a culpa deste fenômeno deve ser atribuída em proporções equânimes ao ex-presidente e à atual mandatária, recém eleita. Não estou falando da construção civil, que espera um 2011 auspicioso. Tampouco da indústria e do comércio, ainda embalados na onda da ascensão da classe C. O rebanho das vacas magras pastará, eu garanto, no campo da mídia.

Luiz Inácio, quando subiu a rampa do Planalto, pareceu não ter encontrado lá no alto um gabinete. Primeiro, galgou um palanque. Depois, um palco. Correligionários e oposição foram unânimes em classificar sua passagem pelo mais alto cargo da República como sendo espetacular. Incrivelmente, criticavam-no e o louvam utilizando igual termo. Afinal, mais do que um líder, Lula foi um astro. Desde o primeiro minuto da manhã, até o recostar no travesseiro, nosso presidente fazia a festa dos jornalistas de plantão. E, para seguí-lo em suas constantes viagens, os veículos precisaram montar muitas escalas de profissionais.

Se existiu algum investimento seguro nos últimos oito anos, foi o de ter repórteres e fotógrafos colados em Lula. O homem era uma usina de notícias. Sobre sua cabeça pousaram centenas de chapéus, para todos os gostos. Se recebesse motoqueiros, pousava de easy rider. Em uma plataforma de petróleo, vestia macacão, capacete e pintava as mãos de negro. Entre atletas, estava de abrigo esportivo. Opinava sobre qualquer notícia produzida no globo, criava metáforas definitivas sobre os mais variados temas. Para cada líder mundial era reservada uma graça, em cada viagem oficial era produzido um fato. Ou muitos. Fosse para rir, chorar ou esbravejar; provocando encantamento ou indignação, nunca antes na história desse país alguém foi mais disponível.

No final de semana passado, Dilma Rousseff esteve em Porto Alegre. Tudo indica que isso será uma rotina, pois há uma neta recém nascida, o ex-marido é seu conselheiro e, enfim, parecem fortes os laços de família. Agora eu pergunto: Dilma se vestiu de prenda? Foi ao Galpão Crioulo e fez um sarandeio enquanto um peão dançava a Chula? Ao menos comentou sobre o calor que faz em nosso verão? Nada. As únicas reportagens produzidas informaram do aparato de segurança presidencial e que um rapaz de uma empresa que conserta aquecedores de água foi chamado para um reparo em sua residência (tudo assim, indeterminado mesmo). E nenhuma foto. Muito menos de Dilma, protagonista, alcançando a chave de fendas ao operário. Este último, aliás, soube se tratar de uma cliente ilustre apenas depois, pela imprensa.

Voilá! Apagaram-se as luzes da ribalta, acendeu a luz vermelha nas redações. Alerta geral: nossa presidente, ao que tudo indica, candidatou-se para baixar a cabeça e trabalhar. E, como sabe qualquer autor de novela, com as personagens trabalhando não há trama que se sustente. Imaginaram um BBB ambientado em um escritório onde todos estivessem ocupados? Um desastre! Logo, aquela Dilma onipresente, sorridente e falante, quase luliforme, era pura estratégia de campanha – com eficiência comprovada, diga-se. Na vida real, a presidente preserva sua intimidade e tem alma de coadjuvante. A TV, o rádio e o jornal prescindirão de tanta gente em sua cola. E nenhum patrão gosta de pagar funcionários ociosos.

Dilma Rousseff poderá cumprir um mandato excelente, correto, sofrível ou desastroso – só o futuro dirá. Mas nada indica que teremos outro governo espetacular. Sem show, não há ibope. Sem ibope, não há empregos. Fez-se o silêncio nas redações. Os amigos jornalistas que me perdoem, mas habitavam uma bolha especulativa inflada pelo ego do presidente anterior. Seguindo a cartilha de RH, aproveitem esta crise para buscar novas oportunidades. Quem sabe na editoria de esporte? Como diria Lula, craque de verdade joga nas onze.

 

10 comentários:

Paulo Seth disse...

Espero que seja trabalho que a esteja mantendo ocupada e distante da midia e nao a nocao de que ela ainda nao detem o de fato controle da nacao. Bom, agora o AeroLula tera que ser re-batizado de AeroDilma ou AeRousseff e, coitado, apos um glamoroso periodo voando para destinos internacionais espetaculares terah que se contentar com a frequencia de uma menos glamorosa rota BSB-POA.

Maria Lucia disse...

Oi, Rubem
como sempre, ótimo!
Mas, gostaria de fazer um comentário sobre o que chamas de "ego do presidente anterior".
Caso fosse só por causa do seu ego, achas que os holofotes do mundo inteiro estariam sobre ele durante tanto tempo? Acho que não.
Beijo

Rubem Penz disse...

Paulo Henrique, esperança é o que sempre nos alimenta... Boas ponderações! Grato, abraços, Mano

Rubem Penz disse...

Maria Lúcia, "só" não está em meu texto, e sim em tuas palavras. Isso faz pensar. Abraço, muita gratidão pela companhia qualificada, Rubem

Marcelo Rosa Gomes disse...

Amigo Rubem. Nunca verás esta foto da prenda. Falsa Gaúcha que é, a bisca só vai ficar naquele terninho tipo saco de batatas. Aquilo lá só veste calças...

Rubem Penz disse...

Marcelo,
Sim, ela é Mineira. Passou tanto tempo por aqui que até esqueço... Mas saco de batatas já é maldade. Há um esforço que merece ser valorizado. Abraços, Rubem

Rubem Penz disse...

Vale um comentário sobre mensagens recebidas dentro e, principalmente, fora deste fórum por causa desta postagem: entre a escuridão do contra e excessiva claridade da adesão (ou vice e versa!), habita a aprazível e sempre almejada meia luz. Abdicarei da cegueira agora e sempre! Abraços, Rubem

Marcelo disse...

É, magrão. Como dizia mnha vó, e aposto que a tua também: Pior cego é o que não quer ver. E alguém também dizia: Acorda Brasil.

Mariane de Macedo disse...

Acredito que o fato dela ser mulher também a faz ser comprometida com o trabalho. Tenho esperança que a mentalidade de nosso povo mude, através deste exemplo. Um abraço querido amigo.Mariane

Rubem Penz disse...

Mariane, o gênero realmente pode influenciar, tens razão. Aliás, isso merece até uma nova reflexão. Não te animas? Muito grato, abraços do afilhado Rubem

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