3.9.10

Número 385

NÃO SEI EM QUEM VOTAR*

Rubem Penz

 

Esta é uma obra dedicada ao nosso sistema político e partidário que, mesmo imperfeito, não pode ser responsabilizado pelas falhas dos homens que o denigrem ainda mais a cada pleito. Nasceu para ser interpretada por um eleitor e um político – candidato ao Legislativo ou Executivo, tanto faz. Como foi escrita para ambos, é possível depreender o nome da dupla: Caracu. O político é o cara. O eleitor entra com o talento que lhe resta.

 

Eleitor: — Eu sei que vou votar...

Político: — Eu sei que vais votar...

Eleitor: — Por toda a minha vida eu vou votar...

Político: — É nossa salvação regimentar.

Eleitor: — Em cada escurtínio eu vou votar...

Político: — Encare o sacrifício de votar.

Ambos: — Democraticamente, assim se vai votar!

 

Eleitor: — E cada voto meu

Político: — E cada voto teu

Eleitor: — Será

Político: — Será

Eleitor: — Pra mal dizer

Político: — Pra eu poder

Eleitor: — eu não saber votar...

Político: — só me locupletar...

Ambos: — ... por toda minha vida!

 

Eleitor: — Eu sei que vou chorar

Político: — Eu sei que vais chorar

Eleitor: — A cada ausência tua, vou chorar

Político: — A cada ausência minha, vais chorar

Eleitor: — Mas cada falcatrua há de custar

Político: — Mas cada falcatrua há de gerar

Eleitor: — Bem mais que tua ausência me custou

Político: — Bem mais do que a campanha me custou

 

Eleitor: — Eu sei que vou sofrer

Político: — Eu sei enriquecer

Eleitor: — A eterna desventura de viver

Político: — Na eterna boaventura de viver

Eleitor: — A espera de te ver ao lado meu

Político: — A espera de viver salvando o meu

Ambos: — Por toda nossa vida...

 

*Paródia propositalmente sofrível, pois sofrida, de Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes

 


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