Número 498
Rubem
Penz
E a vida o
que é?
Diga lá meu irmão
Gonzaguinha
O
teórico Antonio Cândido analisando a crônica – gênero literário que está diante
de seus olhos – festeja o fato de ela ter um status menor. Chega a afirmar que
jamais teremos um Nobel cronista, o que, de fato, a história apenas confirma. Lá
pelas tantas, cita que essa característica é muito útil: “E para muitos pode
servir de caminho não apenas para a vida, que ela serve de perto, mas para a
literatura.”
Pois hoje,
repousando os pés no chão depois de sorver a enorme celebração que foi o
lançamento da antologia Santa Sede –
crônicas de botequim, Safra 2012 (Ed. Literalis), posso afirmar que a
inversão do raciocínio também é uma oração verdadeira: a crônica para muitos
pode servir de caminho não apenas para a literatura, que ela serve de perto,
mas para a vida.
A participação
de pessoas com diversas ocupações laborais em oficinas literárias faz surgir,
no mínimo, leitores mais qualificados – fato que ninguém contesta. Afinal,
trilhar caminhos que nossos melhores escritores já passaram, e estar defrontado
com a tarefa de percorrê-los a partir da própria elaboração, desenvolve a
capacidade de ler os textos em sua estrutura, desvendando aos poucos as
estratégias que muito nos encantam. Mas, boas experiências levam ainda mais
adiante.
O patamar
seguinte é o de reconhecer-se capaz de produzir literatura, boa literatura, perseguindo
o brilho dos grandes astros. Encontrar a voz mais confortável e estendê-la aos
limites da criação sem perder-se na pauta. Conhecer a voz do outro e aceitar as
diferenças com naturalidade. Mais: maravilhar-se com a diversidade de
interpretações sobre um mesmo tema lendo-a como diferente, não melhor ou pior.
Apenas outra.
Alcançar esses
dois estágios – qualificar a leitura e capacitar a composição – é um bom destino
para toda oficina literária. Agora, o caráter confessional e o grau de
exposição inerentes à crônica, quando a turma conquista um patamar de confiança
mútua, nos faz passar para adiante dessa fronteira. E a Santa Sede tem chegado lá.
Ao cabo de seu
terceiro ano, no adeus à terceira turma, depois de estarmos tão perto uns dos
outros, afirmo sem medo: concluímos a passagem pela mesa de boteco, além de
melhores escritores, pessoas melhores. Sou grato por terem me dito em palavras
e gestos, afinal, o que é a vida. Isso é a vida.
2 comentários:
Verdadeiro e belo, o texto. Como a vida.
E que importante o teu trabalho, Rubem, como cronista e tb como mestre, encubador. Lembro que quando pela primeira vez ouvi sobre tua trajetória, não foi pelo google, foi da boca de urna, o q já me encantou. :)
Pois este texto escancara o que é a crônica em ti: visceral. Parabéns pelo trabalho e por mais uma obra coordenada!
abraço
Obrigado, Tatiana!
És generosa nas palavras, e por isso sou grato. Tomara que seja possível continuar com esse trabalho que me encanta a cada nova turma, em cada novo texto.
Abraço, Rubem
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